quinta-feira, 29 de abril de 2010

Keep your money. I want change

Passam-se hoje 57 dias desde que escrevi sobre um filme pela última vez. 57 é também o número de letras que usei para escrever a primeira frase. Nerdices sobre coincidências numerológicas à parte, hoje escrevo sobre o filme que vi há pouco chamado Mary and Max. É do mesmo realizador da curta-metragem Harvie Krumpet, vencedora de um Oscar e que há uns anos estava sempre a dar no canal Hollywood. Não sei porque é que este gajo gosta de protagonistas com doenças mais ou menos fodidas mas por mim pode continuar desde que o resultado sejam filmes que me agradam. É um filme animado mas não é para crianças, de todo. Há homicídios e suicídios acidentais e propositados, doenças mentais graves, excesso de peso e animais mortos, velhos e alcoolismo e um pastor de ovelhas gay. A história é sobre dois amigos por correspondência, ou pen pals se preferirem: Mary, uma garota australiana feia e gorda, com uma vida desagradável e solitária e Max, um judeu quarentão de Nova Iorque, autista e obeso. Bem sei que à primeira vista parece uma lista de coisas que se podem ler numa capa do jornal O Crime. Mas não é e estes são exactamente alguns dos elementos que tornam o filme bonito, de tão feio que é. Aliás, não vejam o filme com a expectativa de que é tudo muito mau mas no fim há uma fada montada num cavalo branco a distribuir doces pelo serviço de chá que fala e dança e conta piadas ao gato que fuma erva (e também fala), que por sua vez é muito amiguinho dum rato cozinheiro (que também fala). Não. Este filme tem bonecos mas não são desses. Agora que falei em pen pals recordo que no primeiro ano do ciclo impingiram-me isso nas aulas de inglês. Preenchi um formulário e sei que escolhi o número máximo de amigos que poderia ter. Deram-me depois uma lista com moradas e de todas só escrevi a uma que era do Nepal ou do Sri Lanka, já não me recordo. Só sei que não responderam. Nessa altura cheguei a receber uma carta de Inglaterra de um garoto ou garota qualquer mas tal como o meu amiguinho nepalês ou cingalês também não respondi. De volta ao Mary and Max... no filme há uma personagem que não tem pernas e é agorafóbico. Acho que um perneta agorafóbico é uma ironia do caraças - um gajo que não pode ir a quase nenhum lado ter medo de ir a qualquer lado. Apesar da infância triste a Mary lá cresce e casa-se. O casamento não dura muito mas ela tem culpa no cartório, então o marido (que antes já se afirmara como fã do Sr. Boy George) leva-a a Mykonos na lua-de-mel e a burra não suspeita de nada? O filme é bom mas parece-me que não teve lá grande sucesso. Se não fosse uma animação e tivesse o Tom Hanks no papel de Max, todo gordo e sebentão a suar o fato de treino gritava-se logo nomeação para os Oscares. Tenho ainda de fazer referência às receitas culinárias do Max, aposto que as encontrou num livrinho de apontamentos da Beth Ditto mas para se armar em esperto diz que as inventa. Por fim, a piada privada é demasiado óbvia para ser ignorada: a Mary só pode ser a filha bastarda do vidrinhos.

Bom: O filme é quase a preto e branco e isso dá um ambiente muito apropriado à história; gostei do sotaque usado pelo Seymour Hoffman; a certa altura do filme parece que começa a tocar a música da Liga dos Campeões mas depois vai-se a ouvir e não é. Isto parece-me bom, não gosto cá de misturadas; a cena do mimo é isso mesmo - um mimo.

Mau: Apesar de ser um filme de animação e de ter animaizinhos e tudo, o filme pode tornar-se um bocado deprimente; por muito má que seja a vida de alguém, gostar do cheiro a galinha molhada não ajuda em nada.

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