terça-feira, 7 de setembro de 2010

Running scared

Não que eu seja um especial apreciador do género, mas de tempos a tempos lá aparece um filme de terror que até acho giro e que depois me permite dizer coisas muito engraçadas e profundas, em conversas também elas riquíssimas, como "ah, esse já vi tem uma velha que se baba. É giro, por acaso". Não há nada como um "por acaso" no fim de uma frase. É a expressão ideal para sublinhar o quão condicionado é o nosso apreço por algo, ou quão distante está o nosso bom gosto do das outras pessoas, sem no entanto mudar nada numa conversa. Por exemplo, se alguém me disser "odeio o Sting mas a música Englishman in New York até é gira, por acaso" eu não deixo de achar o Sting um chato do caraças que quase me põe a pensar em auto-mutilação mas também não invalida a salvação dessa pessoa, afinal de contas só gosta de uma musiqueta do gajo dos Police. O "por acaso" antecedido de vírgula é a expressão de casualidade perfeita, é o complemento circunstancial por excelência e a que todos devemos a nossa homenagem. A não ser que o assunto da conversa seja o Rui Patrício, a Luciana Abreu ou aqueles cereais que são umas bolachinhas foleiras, o "por acaso" safará qualquer um que o use, sem comprometer os seus gostos secretos e duvidosos. Trivialidades masturbatórias sobre gramática à parte, ficou claro que hoje venho falar de um filme de terror e não, não tem nada a ver com uma fita caseira da Betty Grafstein a ter sexo com um tapir malaio. Refiro-me a Drag Me To Hell, realizado pelo já batido no género Sam Raimi. Acho importante saberem que é um filme de terror e não um filme de susto. O suspense é quase nulo e tudo se resume a um grafismo bonito, exagerado e por vezes doentio, bem ao estilo dos Evil Dead. A história começa com uma ex-gorda analista de empréstimos, que em competição com um asiático por um melhor lugar no banco recusa a repetição de um empréstimo a uma cigana de leste. Note-se que falamos de um cenário muito pouco português. Primeiro, porque nunca vi um chinês a trabalhar num sítio que não cheire a incenso e plástico e/ou fritos, depois porque os ciganos de leste só entram num banco se for para o roubar e se a falta de dinheiro for assim tão grande têm sempre os dentes para vender. Como digna representante de uma minoria étnica pouco razoável, depois da nega da rapariga começa logo uma chinfrinada digna do Bulhão e roga uma praga já antiga à moça que, coitada, até tem bom coração mas há que subir a pulso e tomar decisões difíceis se quisermos ganhar dinheiro para ser felizes e comprar coisas. Claro que isto não se aplica a todas as pessoas, qualquer brasileira no Porto sabe que para ter dinheiro basta comer o Pinto da Costa. Dá-se então início à já repetida fórmula fui-amaldiçoada-e-agora-vou-ter-de-sofrer-as-consequências-e-levar-com-os-devaneios-de-um-demónio-muito-fodido-que-me-quer-levar-a-arder-no-inferno-até-conseguir-aplicar-a-fórmula-que-um-vidente-monhé-me-indicou. Vidente esse que é o indiano do Inception, já agora. Oh, depois há de tudo. Desde baba em quantidades generosas, qual torneio de boccia, gatinhos mortos à facada para mais tarde serem vomitados, uma cena que funde de forma incrível fisting com deepthroating... enfim, uma parafernália de cenas com janelas a partir e objectos a voar, gritos e outras coisas muito assustadoras que vos porão a chorar e a gritar pela mamã. A não ser que sejam os príncipes de Inglaterra, nesse caso por muito que gritem não terão resposta. Enfim, o filme é giro tendo em conta o que é e sem esquecer que a última vez que o Sam Raimi realizou alguma coisa saiu o Spider Man 3 [inserir palavras de indignação aqui]. Se gostaram dos Evil Dead e conseguirem ignorar que o terror de há vinte ou trinta anos atrás era, no mínimo, mais engraçado acho que talvez consigam gostar deste e o final até está renhé-nheu-nheu, mesmo que previsível. Se preferem antes terror na onda dos Saw, estimo bem que se lixem porque se algum vale mesmo alguma coisa é o primeiro, o resto é só arrepios e para isso já me chega ver o Eduardo na baliza da selecção e eu até acho que ele fez um bom mundial, por acaso.

Bom: Poucos efeitos visuais computorizados - aprecio bastante esta ausência em filmes que pretendem ser assustadores; as músicas que acompanham as cenas mais spookie até estão giras; a cena em que o demónio entra no corpo do bode lembrou-me a marca arqui-inimiga d'A Vaca Que Ri.

Mau: Não aparece uma só gaja excepcionalmente boa durante todo o filme; os dentes da velha puseram-me a pensar no hálito da senhora; podia haver mais sangue e uns desmembramentos também não ficavam mal a ninguém; no fundo peca pela ausência de grandes cenas com violência gráfica estúpida, com braços, cabeças e outros membros visivelmente falsos a voar e gosmas de cor berrante a jorrarem. Eu estava à espera disso, raios partam os Evil Dead.

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