segunda-feira, 26 de setembro de 2011

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Preparem o snack, descalcem os sapatos e sentem-se que a televisão já está ligada. A época tauromáquica está perto do fim e os combates de vale-tudo não abundam mas outra coisa qualquer há-de dar, quanto mais não seja uns obesos a arfar de fome e cansaço em directo ou uns jumentos fisioculturistas a envergonhar os pais, fechados numa casa cheia de segredos, qual curral da KGB. Só têm de escolher entre a SIC, que num estilo grimmiano nos apresenta uns sapos gordos que viram sapos ex-gordos ou a TVI que ignorando a mariquice que são as fábulas nos espanca à bastonada com o filho enjeitado e mal formado (leia-se com espinha bífida que quanto mais gráfica a imagem melhor), fruto do caso de uma só noite entre o elenco completo do Jersey Shore e o José Castelo Branco em esteróides. Mas... e a febre oh-não-o-Angélico-morreu, já passou? O share da TVI acena-nos afirmativamente com o sorriso de quem acendeu mais um Cohiba sem precisar de pedir lume à Sónia Brazão. Ainda assim, no outro dia vi à venda um livro chamado Uma Estrela Nunca Se Apaga, que não é mais que umas analfabetices lamechas, uma compilaçãozinha de citações do defunto e amigos acompanhadas por umas fotografias também elas profundas, quais sulcos abdominais da tal estrela que afinal sempre se apagou. Ao que parece, certos corpos celestes que se prestam a ícones juvenis podem ir até aos 235km/hora mas a partir daí (e perdoem o trocadilho fácil e cansado) o céu é o limite. O céu ou os rails de protecção da A1. Esta é a obra que centenas de jovens têm na mesa de cabeceira, aborrecidos por as leituras obrigatórias da escola não terem nada a ver com vampiros, escrita por uma tal de Margarida Bugalho que, em pleno direito, não recusa uns cobres no bolso como recusará o título de sanguessuga oportunista. Isto não vos diz nada sobre as pessoas em geral e sobre Portugal em particular? A mim diz. Afinal o povo não é nobre, a nação não é valente e os egrégios avós são agora uns velhos esquecidos. O povo é rasca, a nação está à rasca e os avós, velhos e esquecidos, estão entorpecidos por uma novela ou reality show quaisquer, desculpados dos erros que cometeram no tempo em que as coisas eram "muito diferentes". Este é o país onde todos sabem de cor os detalhes mais escabrosos da vida privada de duas dezenas de parolos fechados numa casa térrea na Venda do Pinheiro mas poucos percebem a referência a 1984. É o país onde metade da população tem peso a mais mas continua refastelada no sofá a ver os gordinhos de camisolas às cores a emagrecer, enquanto come e consome exactamente as mesmas porcarias mas agora de marca branca que a crise, malvada, não é para brincadeiras. Onde todos asneiram incomodados com a crise da Madeira e os problemas do país mas depois do telejornal pedem silêncio que vai jogar o Benfica ou é noite de nomeações; até porque são todos iguais nem vale a pena comentar - era pôr uma bomba no parlamento e matá-los a todos. É o país onde a maioria da garotada vai ser incomparavelmente mais burra que há 20 anos atrás (quando já na altura nos adivinhavam como tal) mas em que qualquer pai se baba ao ver o filho mexer num telemóvel aos 6 ou num computador aos 10 mesmo que aos 18 não lhe consiga dizer a data da fundação do país que parasita. É o meu país preferido mas há uma absurda e crescente maioria a lixar-me as preferências e a convencer-me de que gasolina e sal não destoariam num memorando de entendimento entre um fósforo e as casas de quem está há demasiado tempo habituado a ouvir cantar sobre o portuguesismo que há na alegria da pobreza. As crises económicas são cíclicas, a história já o provou. A estupidez de um povo, não sendo genética, tem boa parte de Portugal a ligar para números de valor acrescentado a tentar provar o contrário. Só espero que não se torne histórica.

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